O debate em torno da habitação em Portugal tem sido marcado por uma visão polarizadora que carece de maior clareza.
Não devemos tratar a questão como um problema transversal a toda a sociedade, porque, simplesmente, não é. Portugal é um país onde 73% dos agregados familiares são proprietários de um imóvel. Este grupo tem assistido, nos últimos anos à valorização das suas poupanças materializadas na casa que compraram ou herdaram. Para estes, a narrativa de um "problema generalizado" é difícil de compreender. Quem é proprietário de uma casa, dificilmente vê um problema na sua valorização.
Quem não possui qualquer habitação, está confrontado com uma grave situação. O aumento exponencial dos preços de compra e arrendamento torna o acesso a uma casa um desafio cada vez maior. Este é o verdadeiro problema. A confusão surge quando tratamos estas duas realidades tão distintas como se fossem uma só, resultando em políticas que não resolvem nada.
Nenhum proprietário se entusiasma com a ideia de a sua casa perder valor e é compreensível que não o faça. Por outro lado, nenhuma pessoa sem casa alguma pode aceitar com resignação a crescente inacessibilidade à habitação. O grande desafio é encontrar soluções que respeitem estas duas realidades diametralmente opostas, conciliando os interesses de ambas as partes sem comprometer a estabilidade do mercado.
É aqui que entra a necessidade de um novo paradigma para o mercado de habitação. Um sistema assente em três segmentos distintos: um segmento de habitação pública que necessita de ser significativamente incrementado para atender às populações mais vulneráveis e garantir um mínimo de dignidade habitacional; um segmento livre que continua a caracterizar a generalidade do mercado e um novo segmento de habitação com preços controlados, capaz de oferecer soluções acessíveis sem prejudicar os restantes. Este segmento será viável através de uma parceria/contrato entre o Estado e os privados. O modelo funcionaria com o Estado a disponibilizar terrenos, conceder isenções fiscais e garantir agilidade no licenciamento em troca de preços reduzidos, cerca de 50% do valor de mercado. As casas assim construídas só poderiam ser transacionadas pelo preço inicial acrescido da taxa de inflação, sob pena de reembolso dos benefícios concedidos. Este modelo ofereceria uma alternativa viável a quem não encontra solução nos segmentos tradicionais.
Medidas adicionais que procurem moderar os preços no mercado livre serão sempre bem-vindas, mas é fundamental reconhecer as suas limitações. Reduções de 5%, 10% ou mesmo 15% no preço de imóveis ou rendas dificilmente transformarão o mercado numa opção acessível para a maioria. Para que possamos falar verdadeiramente de acessibilidade habitacional, é imprescindível introduzir verdadeiras soluções estruturais. Haja vontade nesse sentido…
Artigo de opinião de Paulo Caiado, presidente da APEMIP